02 outubro 2010

Santinho não... santão!

Serei só eu que acho ridículo que se diga "Santinho" às pessoas adultas quando elas espirram? O que é que isto quer dizer? Ou melhor, porque é que o santo é tão pequenino, afinal? Porque, OK, percebe-se que se diga "Santinho" aos pequeninos, porque olhamos para a cara deles e (a maior parte das vezes) é mesmo isso que eles parecem. Agora a um adulto...

Penso que é claro que ao dizermos "Santinho" estamos efectivamente a chamar santinho à pessoa que espirrou, por isso é que dizemos Santinho aos homens e Santinha às mulheres. A alternativa seria estarmos a invocar um qualquer santo que fosse igual em género ao do nosso interlocutor, mas não me parece que assim seja, até porque talvez um homem preferisse que se invocasse uma santa e vice-versa (que diriam os homossexuais e os travestis?), que confusão que não seria. Portanto, admitindo que lhes estamos a chamar Santinhos, porque não lhes chamar Santos a partir do momento em que fazem 18 anos? Ou então Senhor Santo, a partir dos, sei lá, 40?

É um bocado parecido com o facto de dizermos "para o menino" quando cantamos os parabéns a uma pessoa adulta. Mas aí sabemos que o fazemos de forma consciente (aliás, aqueles que tentam "manter as aparências" e dizer "para o senhor" no meu entender ficam mais mal que bem). Há até quem seja apologista de que quem faz anos é "bebé" no dia do seu aniversário. Chamar "menino" a uma pessoa adulta, conscientemente, no dia do seu aniversário, é fazer-lhe um elogio, é fazê-lo voltar aos seus tempos de infância, e portanto, quanto a isso não tenho nada contra.

Mas o "Santinho" é involuntário, é uma expressão que proferimos quase por reflexo, sem pensar nas consequências dos nossos actos. "Santinho" era algo que os nossos pais nos diziam desde pequeninos, que ficou gravado na nossa mente e que continuamos a usar com toda a gente na falta de uma expressão melhor. Não temos nada do nível de um "Bless You!" anglo-saxónico (algo parecido com "Deus te abençoe" quando traduzido à letra). Aliás os próprios estrangeiros, ao aprender português (já para não falar dos lusófonos do Brasil) têm dificuldade em perceber a expressão "Santinho/Santinha", substituindo-a frequentemente por "Viva" ou "Saúde", alternativas que não convencem (ninguém aqui diz "Saúde" assim do nada, e "Viva" é mais uma forma de cumprimento) mas mesmo assim são mais dignas. Outros, já portugueses, têm as suas próprias alternativas, que no fundo expõem o ridículo da situação, casos, por exemplo, de "Diabinho" ou "Nunca fostes" (sic).

E depois há também casos em que, além de ridícula, a expressão é desconfortável ou mesmo injusta, quando nos apercebemos que estamos a chamar santinho a alguém de quem não gostamos ou mesmo que, na nossa opinião, é tudo menos um santo. Imaginem dois lutadores de boxe naquelas conferências de imprensa que antecedem o combate:

- Este senhor que tenha cuidado comigo, porque no combate vou dar cabo dele.
- Eu não tenho medo, pá, bates como uma menina!
- Bato o quê? Queres ver se queres levar já!
- Anda cá, menina, que eu não tenho medo!
- É pá, eu parto-te todo, eu dou cabo de ti!
- Anda cá, anda cáaaaa... atchim!
- Santinho.

Pensem bem nisto. Chamariam santinho ao colega que foi promovido não por trabalhar de forma exemplar, mas por passar o tempo a dar graxa ao patrão e a falar mal dos outros? Chamariam santinha à colega coscuvilheira, que sabe tudo da vossa vida, vá-se lá saber como, e não se inibe de a contar a quem quer que seja que lhe apareça pela frente? Então e aquele senhor com ar de cinquentão, cabelo grisalho e nariz abatatado, que nos pede sempre para fazer sacrifícios mas depois não cumpre o que prometeu? Que lhe diriam a ele quando espirrasse? Tem que haver uma outra expressão. Tem que haver uma alternativa.

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